Os desafios envolvem, por exemplo, quem consome a maior quantidade de alimentos hipercalóricos em menos tempo ou quem ingere refeições apimentadas, ou de uma só cor por 24 horas
Desafios alimentares, promovidos por influenciadores nas redes sociais, têm se tornado populares e atraído milhões de visualizações, que geram lucro e visibilidade para quem promove e problemas de saúde para quem consome, segundo especialistas.
Os desafios envolvem, por exemplo, quem consome a maior quantidade de alimentos hipercalóricos em menos tempo ou quem ingere refeições apimentadas, ou de uma só cor por 24 horas.
A CNN utilizou a plataforma Pinpoint, ferramenta de jornalismo do Google, para identificar os termos mais comuns nesses desafios e transcrever os conteúdos, tanto dos vídeos, quanto das entrevistas de especialistas sobre o tema.
A análise de 11 vídeos, selecionados com base no critério de diversidade de desafios e alcance, revelou o uso frequente de expressões como “exagero”, “morrendo” e “rápido”, sugerindo comportamentos prejudiciais, especialmente entre jovens, que são mais suscetíveis a desenvolver transtornos alimentares.
A nutróloga Marcella Garcez, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia, destaca que o acesso precoce a esses conteúdos pode resultar em desequilíbrios metabólicos e transtornos alimentares.
“Essa população, que cada vez mais cedo tem acesso às redes sociais, deve ser protegida, pois é a mais impactada pelos transtornos alimentares e seus desequilíbrios”, afirma.
Distração e diversão X riscos à saúde
A psicóloga Maura Albanesi também alerta para o impacto psicológico desses desafios. Segundo ela, a palavra “desafio” exerce um forte apelo, fazendo com que as pessoas percam a noção do que é saudável.
“O influenciador, ele tem um poder de dar um comando de ação para o outro onde o outro não mede o que tá fazendo, sabe. Como se fosse um robozinho mesmo”, explica.
Além de transtornos como anorexia, bulimia e compulsão alimentar, especialistas apontam que esses desafios podem perpetuar hábitos alimentares nocivos.
“Esses transtornos podem se manifestar na juventude e permanecer pelo resto da vida, resultando em consequências físicas e emocionais graves”, adverte Garcez.
Prêmios em dinheiro e mais excessos
Um dos desafios analisados é promovido por um casal com mais de dois milhões de seguidores no TikTok, que oferece prêmios em dinheiro para quem conseguir comer mais rápido do que o influenciador.
“É isso mesmo! Basta comer mais rápido que eu e leva quinhentão. Para essa disputa, peguei vários Fast Foods”, anuncia em um dos vídeos.
Já em um canal menor, com 610 mil seguidores, duas mulheres participam de um desafio sem prêmios, onde engolem sanduíches e fazem piadas sobre só beber refrigerante se estiverem “quase morrendo”.
“Tem um copo de refrigerante aqui. Teoricamente, não é para pegar, não é para beber, mas “pô” tá entalada, quase morrendo, quase sacrificando, quase entrando no cadáver, tá aqui. A gente vai deixar aqui para vocês também. Estão vendo, tá?”, diz.
A influência dos vídeos
Mesmo em tom de brincadeira, a repetição desses conteúdos pode influenciar o comportamento alimentar dos jovens. Albanesi explica que, ao assistir repetidamente esses vídeos, a mente dos espectadores pode internalizar a experiência, como se a tivessem vivido.
“A nossa mente, ela não distingue aquilo que vejo da minha própria realidade… Porque a partir do momento que introjeta algo e a minha mente reconhece aquilo como “eu vivi” aquilo eu vou reproduzir pela repetição” diz.
Outros desafios incluem passar 24 horas comendo apenas alimentos de uma única cor ou consumir excesso de comida apimentada. Um influenciador com mais de cinco milhões de seguidores brinca sobre “quase morrer” após participar de um desafio com comidas extremamente apimentadas. Ele também promoveu desafios onde passou um dia inteiro comendo apenas alimentos roxos.
“Nós temos que preocupar, temos que estar em todos os espaços orientando as nossas crianças a terem um hábito alimentar porque os hábitos que a criança adquirir ao longo da sua infância e adolescência são responsáveis pelo desenvolvimento de doenças crônicas que vão impactar a qualidade de vida dessa criança lá no final da vida”, finaliza Garcez.
Outro Lado
Questionado se há ações de monitoramento em relação ao tema, o Ministério Público de São Paulo informou que, embora situações correlatas já tenham sido investigadas, não há procedimentos específicos abertos sobre a promoção desses desafios alimentares nas redes sociais.
A plataforma Tiktok teve acesso aos vídeos publicados e são citados na reportagem. Questionada se há algum tipo de restrição, a assessoria da rede social enviou um link que dá acesso às diretrizes da plataforma sobre desafios.
(Fonte)